Num passado distante, a perseguição religiosa acontecia porque, geralmente, uma religião dominante se entranhava ao poder político e, em nome da hegemonia, bania quem pensava de modo diferente. Foi assim entre gregos, romanos, no antigo Israel, na Idade Média, e até em tempos mais recentes, vide a perseguição aos movimentos restauracionistas do século XIX.
Durante a II Guerra Mundial – para além do flagelo terrível que todos já conhecemos – também houve perseguições contra minorias religiosas. Sim, além dos judeus (enquanto povo), outras minorias étnicas e religiosas eram encarceradas, escravizadas e mortas.
Chute na santa
Mas parece que nada disso que aconteceu no passado serve de exemplo para que o mundo “não volte a repetir tais mazelas”. Ao contrário. O que temos notado nos últimos anos é uma contínua repetição de erros. De programas de TVs que demonizam pais e mães de santo, a pastores que chutam ícones sagrados de outras denominações religiosas, o terror continua!
Terreiro depredado
Em nome da fé, sob os olhos do Estado, e a inércia de muitos, homens armados invadem casas de culto de religiões de matriz africana e quebram tudo. Muitos religiosos são expulsos de suas residências e têm de retomar a vida a partir de outra localidade; caso contrário, morrem. Isso acontece no Brasil, em pleno século XXI. Tá na dúvida? Dê “um Google” e surpreenda-se!
Felizmente, nosso Estado (ainda) é Laico. Então, os perseguidos podem, de algum modo, recorrer, processar, enfim, tentar algum tipo de reparação pelo dano sofrido. Muitas vezes, porém, a reparação é tão pífia que mais parece uma piada do que um reparo de fato.
Testemunhas de Jeová na Rússia
Mas em alguns países, como é o caso da Rússia hoje, minorias não podem, sequer, recorrer, pois a perseguição é feita sob o amparo estatal. É o que vem acontecendo com as Testemunhas de Jeová por lá desde 2017. Proscritas sob a alegação de “extremismo”, hoje elas são processadas e presas por serem Testemunhas de Jeová. Apenas isso! E não há qualquer critério: jovens, idosos e até deficientes estão indo para a cadeia. Há relatos de espancamentos e torturas. Assusta que isso ocorra num país que tem a pretensão de ser uma potência global e que, por séculos, foi berço da arte, das ciências, da literatura e da música.
Bahá’ís no Irã
No Irã, há décadas, a pacífica comunidade Bahá’í também é alvo de violenta perseguição. Mesmo sendo a maior minoria religiosa não-muçulmana do país, a opressão por lá não enxerga limites. Nada menos que 200 bahá'ís foram executados após a Revolução Islâmica de 1979 e, desde a década de 1980, têm sido negados a eles a educação superior e os meios de subsistência. Além disso, são difamados na mídia e até mesmo seus cemitérios são profanados. Não por acaso, um grande número de bahá’ís saíram do país após a Revolução.
Mas por qual razão essas coisas acontecem?
Como no passado, a perseguição religiosa de tempos atuais também tem, em muitos casos, um componente importante, que é a promiscuidade entre religiosos e políticos. Seja no caso dos terreiros depredados, ou das Testemunhas de Jeová encarceradas, há muitos políticos e religiosos que não apenas consentem com isso, como também legitimam tais atrocidades.
E há um ingrediente a mais: o silêncio dos “bons”.
Somos tão bombardeados com catástrofes para todos os lados que simplesmente “deixamos passar” a perseguição que ocorre bem diante do nosso nariz. E acabamos, muitas vezes, justificando um ou outro ato de perseguição, tipo: “ah, mas eles são fundamentalistas mesmo, devem ser proibidos na Rússia”; ou “ah, mas eles não servem a Deus, então, nem tenho pena que depredem o terreiro deles”. Afirmações como essas remetem a acontecimentos não tão distantes do nosso tempo, onde muitos morriam porque “não são como um de nós somos”.
Cuidemos para que não sejamos silenciosos com a dor do outro e, mais que isso, para que não sejamos coniventes com qualquer tipo de perseguição. Ou estaremos caindo no mesmo erro daqueles a quem tanto criticamos. E se assim for, já não mais haverá qualquer esperança.
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