Não há medo no amor,
ao contrário: o perfeito amor lança fora todo o medo (1Jo 4:18ª)
“Ai de mim se eu não anunciar boas notícias” (1Cor 9:16). A Câmara Episcopal da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil vem a público conclamar as pessoas que participam de nossa igreja e a sociedade brasileira para uma séria reflexão sobre o segundo turno das eleições presidenciais e para governadores e governadoras nos estados. Vivemos um momento em que comportamentos agressivos, intolerantes e a disseminação de notícias falsas por si só violam frontalmente princípios de fé inegociáveis. Seguidores e seguidoras de Jesus não podem ignorar o quanto, nosso Senhor Jesus Cristo, exaltou quem é mansa, as pacificadoras, as pessoas perseguidas por causa da justiça (Mt 5.9). Pois, a verdadeira religião é a prática do amor, amar a bondade e a prática do direito e da justiça para todas as pessoas (cf Jr 9.23; Mq 6.8; Tg 1.9).
A questão não é que haja conflito na sociedade. Todas as sociedades humanas, em todos os tempos e lugares, convivem com o conflito. Ele expressa, em termos elementares, o inconformismo com a injustiça, a violação de direitos, a opressão econômica, a discriminação. O que nos preocupa como pastores e pastoras é a incitação ao mesmo pela negação ao debate e ao diálogo, pelo ódio a quem pensa diferente e pelo uso da mentira como arma para demonizar pessoas e projetos.
A Igreja Episcopal Anglicana do Brasil faz parte da Comunhão Anglicana presente em mais de 150 países do mundo e que, através de seus documentos de reflexão teológica e de posicionamentos públicos, tem se colocado sem reservas ao lado dos direitos humanos e do respeito a instituições públicas que os assegurem, por meio de ações concretas de promoção da justiça e da paz. É uma comunhão de igrejas que respeita e mesmo acolhe o dissenso, a pluralidade de visões sobre a fé e as opções sociais e políticas de seus membros. É uma igreja que se esforça por construir um caminho de acolhimento, de convivência plural pacífica, em meio às diferenças doutrinárias, éticas e de condição social de todas as pessoas. Preocupa-nos quando irmãos e irmãs de nossa igreja se fecham ao chamado que lhe faz sua própria tradição de fé ao discernimento sério do caminho a seguir.
Não podemos concordar com o uso de linguagem que agride, xinga, mente e desrespeita como caminho para o enfrentamento das diferenças políticas e ideológicas; que glorifica e incita a violência como caminho para a solução de problemas sociais, políticos ou econômicos; que expressa claro descompromisso com padrões mundialmente aceitos de proteção social e garantia de direitos dos pobres, das mulheres e das minorias. O momento que vivemos em nosso país demanda de nós que saibamos reconhecer a árvore pelos seus frutos, que não esqueçamos, num país de maioria cristã, as consequências de manifestarem o que creem ser o legado da tradição ou a verdade bíblica, de que sem conhecimento o povo cai e é desencaminhado, sem lideranças sábias e justas a desagregação e a destruição do futuro sobrevêm, sem a verdade não há como construir a paz e a justiça almejadas.
Reconhecemos que as igrejas e a sociedade brasileira estão divididas, mas apelamos ao discernimento, através da reflexão e oração, com vistas à convivência harmônica das grandes maiorias e respeitando as minorias, com vistas à construção de políticas públicas que enfrentem os problemas brasileiros em clima de absoluto e incondicional respeito às instituições democráticas. Avaliar seriamente programas, não minimizar ou ignorar os sinais que nos chegam de todos os lados – das pessoas agredidas por causa de sua forma de ser ou de pensar, da opinião pública internacional alarmada com os rumos do Brasil, dos intelectuais e ativistas sociais que estudam a fundo nossa realidade e atuam no dia-a-dia das comunidades e nas redes nacionais e internacionais de ação social e de lideranças religiosas que nos admoestam que, tendo Jesus como modelo, precisamos de palavras e ações que produzam solidariedade, curem, cuidem e transformem para o bem comum.
Aos cristãos e cristãs deste país, desafiamos a que leiam de forma profunda e em oração a sua Bíblia, confrontando as mensagens que claramente se opõem ao Evangelho de Jesus, evitando usar o nome de Deus em vão, sacralizando propostas anticristãs e antidemocráticas ou julgando sumariamente como se fossem Deus. Da escolha que vamos fazer neste momento estarão em jogo muito mais do que os próximos quatro anos de um governo. Todos os sinais apontam para o incremento da violência e a discriminação gerando grave risco à liberdade, à justiça e à paz. Que façamos nossa escolha guiadas/os por essas três referências. Só assim dignificaremos nossa identidade anglicana e cristã, só assim provaremos nossos compromissos democráticos. Oremos juntos/as o Salmo 146 (145).
Curitiba,15 de Outubro de 2018
Bispo Naudal Alves Gomes – Diocese Anglicana do Paraná – Primaz da IEAB
Bispo Maurício Andrade – Diocese Anglicana de Brasília
Bispo Renato Raatz – Diocese Anglicana de Pelotas
Bispo Francisco de Assis da Silva – Diocese Sul Ocidental
Bispo João Câncio Peixoto – Diocese Anglicana do Recife
Bispo Humberto Maiztegui – Diocese Meridional
Bispo Eduardo Coelho Grillo – Diocese Anglicana do Rio de Janeiro
Bispa Marinez Rosa dos Santos Bassotto – Diocese Anglicana da Amazônia
Bispo Clovis Erly Rodrigues – Emérito
Bispo Almir dos Santos – Emérito
Bispo Celso de Oliveira Franco – Emérito
Bispo Jubal Pereira Neves – Emérito
Bispo Orlando Santos de Oliveira – Emérito
Bispo Filadelfo Oliveira Neto – Emérito
Bispo Saulo de Barros – Emérito